Brasil e China: Entre a Dependência Econômica e a Necessidade de Diversificação

By Katy Müller 5 Min Read

A relação comercial entre Brasil e China se consolidou como uma das mais importantes no cenário internacional das últimas duas décadas. Desde 2009, a China é o principal parceiro comercial do Brasil, ultrapassando os Estados Unidos em volume de compras de produtos brasileiros. Hoje, quase um terço das exportações brasileiras têm como destino o país asiático, sobretudo commodities como soja, minério de ferro e petróleo. Esse vínculo intenso, apesar de trazer inúmeros benefícios econômicos, também coloca o Brasil em uma posição delicada de dependência, com riscos que demandam atenção e planejamento estratégico para garantir a estabilidade e o crescimento sustentável da economia nacional.

Historicamente, essa relação começou a ganhar força quando o governo brasileiro, ainda sob o mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, reconheceu oficialmente a China como economia de mercado em 2004. Na época, essa decisão foi vista como um passo importante para aproximar os dois países em termos comerciais e diplomáticos, facilitando a ampliação do comércio bilateral. O que se viu nos anos seguintes foi uma explosão do volume comercial, que saiu de aproximadamente 9 bilhões de dólares em 2004 para mais de 35 bilhões em 2009. Essa escalada consolidou a China como maior comprador de produtos brasileiros, uma realidade que se mantém e se intensifica até hoje.

O principal motor dessa relação são as commodities, especialmente aquelas ligadas ao agronegócio, mineração e energia. A China depende fortemente da soja brasileira para alimentar sua população e também importa grande quantidade de minério de ferro e petróleo, insumos fundamentais para sua indústria e crescimento econômico. Por outro lado, o Brasil tem no superávit da balança comercial com a China um dos principais pilares para fortalecer suas reservas internacionais e garantir a estabilidade cambial e financeira do país. Assim, a relação entre os dois países pode ser vista como uma interdependência econômica, ainda que assimétrica, em que o Brasil depende mais da China do que o inverso.

Entretanto, essa concentração das exportações em poucos produtos e em um único mercado representa um risco importante para a economia brasileira. Qualquer desaceleração econômica na China, como a ocorrida entre 2012 e 2015, quando o crescimento chinês diminuiu e os preços das commodities caíram, tem impacto direto sobre as exportações brasileiras e, consequentemente, sobre o emprego e o desenvolvimento do país. Além disso, a concentração em commodities — produtos de baixo valor agregado — limita o potencial de desenvolvimento industrial do Brasil, que vê sua capacidade manufatureira reduzir-se enquanto importa da China produtos com alta tecnologia embarcada, como painéis solares e carros elétricos.

Especialistas em comércio exterior e relações internacionais alertam para a necessidade urgente de diversificação, tanto em relação aos parceiros comerciais quanto à pauta exportadora. A busca por novos mercados, incluindo outros países asiáticos, Europa e América Latina, é uma estratégia que o governo brasileiro vem tentando implementar, ainda que de forma gradual. Além disso, há esforços para atrair investimentos chineses em setores industriais de maior valor agregado no Brasil, que possam fomentar a “neo-industrialização” do país, gerando emprego e tecnologia local. Grandes empresas chinesas já anunciaram investimentos bilionários em energia sustentável, veículos elétricos e semicondutores, demonstrando interesse em ampliar seu papel no desenvolvimento econômico brasileiro.

O desafio, porém, é grande. A dependência econômica construída ao longo de mais de 20 anos não pode ser revertida de forma rápida sem custos e dificuldades. O comércio bilateral é marcado por uma complementaridade natural entre o que o Brasil produz e o que a China consome, o que torna a relação difícil de substituir ou diversificar sem planejamento cuidadoso. Ademais, a concorrência de outros mercados, como o africano na produção agrícola, pode trazer riscos futuros, ainda que atualmente as condições políticas e sociais dificultem essa competição em larga escala.

Portanto, o Brasil vive uma situação complexa em relação à China, um parceiro fundamental para a economia, mas também uma fonte de vulnerabilidade. É necessário equilibrar a manutenção dessa parceria estratégica com o fortalecimento de outros mercados e a promoção de uma pauta exportadora mais diversificada e industrializada. Somente assim o país poderá garantir maior autonomia econômica e segurança frente às oscilações globais, construindo um caminho mais sólido para o desenvolvimento sustentável.

Autor: Katy Müller

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